Quando
decidi escrever este pequeno artigo, fi-lo porque decidi compartilhar
com outros que, eventualmente, se estejam a iniciar neste mundo
da Astronomia, e que se sintam de alguma forma perdidos, os
meus segredos neste campo.
Quando eu comecei na Astronomia,
não foi na mesma época que comecei a gostar e a interessar-me
por estes assuntos. O meu gosto pela Astronomia e pelo espaço
em geral foi despertado na década de 80 pela série Cosmos, do
saudoso Carl Sagan. Pela sua beleza, informação e formato,
penso que esta série foi responsável não só pelo meu
interesse, mas também pelo interesse de muitos mais astrónomos
amadores do nosso país e do nosso Mundo.No entanto não foi suficiente.
Queria saber mais, queria poder fazer as minhas observações.
No inicio pensava
que era uma espécie de bicho raro, que só eu me interessava
por isto. Na realidade das pessoas que eu conhecia, nenhuma
se interessava por estes assuntos e, por vezes, mostravam até
ignorar o que era a Astronomia (pior, confundiam-na com Astrologia...Grrrr
ainda hoje me enervo com isto. Mas isto é assunto que
dá para outro artigo inteiro...). Sempre me senti um
pouco frustrado com isso.
Numa determinada
altura, numa hora morta do escritório, depois do expediente,
decidi fazer uma pesquisa no SAPO por Astronomia. Fiquei bastante
surpreso por ver que de facto não era o único e que havia muitos
mais como eu! Foi gratificante fazer essa descoberta. Duma assentada
descobri a ANOA, a APAA, a Astrolista, a APAAnews. Tratei de
me inscrever na Astrolista e comecei a trocar opiniões, ou melhor,
a colocar questões, porque a parte da troca de opiniões veio
mais tarde...
Lembro-me que
uma das primeiras questões que lá coloquei foi sobre querer
comprar um telescópio e qual me aconselhavam. A resposta foi
quase unânime: nenhum! O que me leva a este artigo...
Quando me aconselharam
a não comprar telescópio, ninguém estava, de modo algum,
a querer desencorajar-me de perseguir o meu gosto pela Astronomia.
Antes pelo contrário, como poderão perceber com a leitura deste
artigo. Porquê não comprar um telescópio? Não é
com um telescópio que se faz Astronomia?
Um telescópio é um
instrumento que nos abre as portas do Universo, é certo, mas
temos de saber o que fazer com ele. Todos os objectos maravilhosos
que podemos observar no Universo estão espalhados um pouco por
todos os quadrantes, enquadrados no espaço delimitado
pelas constelações. Ora, se não se conhecer as constelações,
não adianta de nada ter telescópio. Eu pessoalmente defendo
o conhecimento do céu a olho nú, principalmente pela perspectiva
romântica do astrónomo, a contemplar o céu na
sua magnitude e beleza, ao frio da noite. Hoje em dia os profissionais
estão sentados confortavelmente numa sala aquecida, com equipamentos
"state of the art" a partir de onde controlam os seus telescópios.
Não precisam sequer de saber onde está o Leão
(Leo), Andrómeda (Andromeda) ou a Lira(Lyra)...Tem computadores
que sabem isso tudo por eles.
De facto foi
o que me aconselharam e fiquei a achar que vale a pena. Começar
por aprender a nos orientarmos no céu, conhecendo as constelações,
as estrelas mais brilhantes e como a partir de uma constelação
ou estrela conhecida, se encontram outras, é realmente um bom
método para ganhar prática de observação e se desfrutar da beleza
nocturna dos céus...Aliás este género de
observação provaca-nos um "sense of wonder"
magnifico que nos faz sentir incrivelmente insignificantes perante
a imponência do Cosmos. É simplesmente lindo!
Após bastantes horas de
observação acumuladas e persistentes (sim!... um astrónomo
tem que ser teimoso para vencer o frio...), quando se dominarem
as constelações (atenção! este domínio não significa
conhecer todas as constelações a olho nú! Cerca de metade é
um bom número.) a partir de umas, com a devida prática e bons
mapas, ou cartas celestes, chegaremos, com relativa facilidade,
às outras... E aí...aí sim, poderemos partir à
descoberta do céu profundo e das maravilhas por ele encerradas.
Na fase de descoberta
do céu profundo, ainda precisamos de um telescópio. Um binóculo
7x50 ou 10x50, para além de que o vão usar para sempre, mesmo
com um telescópio, é um instrumento capaz de nos mostrar imensos
objectos de céu profundo. Convém é que tenha um
bom suporte. As Plêiades (M45), a Grande Galáxia de Andrómeda(M31)
são alguns exemplos. Mas um binóculo também
é um bom instrumento para a iniciação à
observação planetária. A dança dos
satélites Galileanos de Júpiter (IO, Ganimedes, Europa, Calisto)
e várias crateras lunares são espectáculos
perfeitamente acessíveis a este tipo de instrumento.
Depois existem ainda diversos
enxames estelares abertos, a Nebulosa da Lagoa (M8), a Grande
Nebulosa de Orion (M42). Alguns enxames globulares, como O Grande
Enxame do Hércules (M13). Tudo isto pode ser vislumbrado
com um binóculo.
Como podem ver um binóculo
abre-nos realmente as portas do Cosmos. E o outro aspecto, que
considero uma grande mais valia do binóculo é
a sensação de profundidade que a visão
binocular nos oferece. Sentimo-nos verdadeiramente mergulhados
no Cosmos. Chega a ser estonteante. Aconteceu-me a mim e acontece
a várias pessoas, na primeira vez que vêem o céu
nocturno com um binóculo.
No momento em
que escrevo este artigo, não tenho telescópio, uso um binóculo
8x56 e garanto-vos que faço observações bastante gratificantes.
Também não vou mentir. Já observei por telescópios de aberturas
desde os 5" até às generosas 18", e as visões não têm nada a
ver, simplesmente o brilho aumenta, os pormenores aumentam,
mas de facto, estas visões são possíveis porque se sabe para
onde apontar o telescópio. E não podemos esquecer um
pormenor muito importante. Se queres um telescópio para
ver as imagens dos livros e revistas, esquece! Essas imagens
conseguem-se com películas fotográficas ou detectores
electrónicos (CCD) muito mais sensíveis que os
nossos olhos. Nas observações directas, não
há cor. No entanto são muito gratificantes, pois
os pormenores estão lá e à medida que evoluímos
na prática vamos descobrindo mais.
Posto isto, eu dividiria
o processo de iniciação em 3 fases.
FASE 1:
Conhecimento do céu a olho nú. Identificar as constelações e
estrelas mais evidentes, aprender como a partir destas, se descobrem
e identificam as menos óbvias . Saber identificar os
planetas mais evidentes (Vénus, Marte, Júpiter, Saturno). Basicamente
aprender a "caminhar" no céu. Continuo a afirmar que este conhecimento
é de facto muito gratificante e vai-te dar imensas horas
de prazer.
FASE 2:
O Salto para o binóculo. Este instrumento apesar de ser pequeno
(que é uma das suas vantagens, cabe em qualquer lado),
pode efectivamente prestar (e presta) um excelente serviço ao
astrónomo. Um binóculo 7x50 ou 10x50 (isto significa
que aumenta 7 ou 10 vezes, e tem 50mm de abertura) vai ser útil
mesmo depois de se possuir um telescópio. É como se fosse o
melhor amigo do astrónomo. Muitas descobertas se farão
com um binóculo nesta fase. E a habituação adquirida
nesta fase, na busca dos alvos a observar, vai ser muito útil
mais tarde, quando tiveres que apontar o telescópio...
FASE 3:
O telescópio. Nesta fase já se domina bem o céu, já sabemos
usar cartas celestes e atlas com precisão e não temos problemas
em encontrar os objectos. Está na altura de voar mais alto e
procurar desafios cada vez mais difíceis. A partir de
agora, cada um escolhe o que pretende e o que deseja ver/fazer.
O Cosmos está aí, é partir em busca dele! Partamos em direcção
ao infinito e ao passado e deslumbremo-nos com as jóias
cósmicas que brilham lá no alto...
Como podem ver, ser astrónomo
não significa possuir telescópio. Nem sequer é condição fundamental.
O processo para se tirar todo o partido da observação com telescópio
é gradual e na minha opinião, deve-se seguir os passos mencionados.
Claro que cada um é como cada qual e isso significa que cada
um dos principiantes encontrará o seu método ideal. Eu encontrei
o meu e este é apenas o meu conselho...e todos sabemos como
são os conselhos, quem quiser guardá-los, guarda, quem não quiser
deita fora!
Boas Observações a todos!
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